sábado, 4 de outubro de 2008

Meu primeiro encontro com Alba

“Você tem que enfrentar o mundo.” Eu pensava alto enquanto trancava a porta. Saí do quarto da pensão com cheio de mofo com os olhos vermelhos. A luz do sol mais do que nunca me incomodava os olhos, mas não ponho os óculos de sol. Atravesso a grande avenida e poucas pessoas me olham e as que o fazem ficam sem graça porque as encaro. Com olhos vermelhos de quem sai de pensão mofada. É triste. Podia ser pior... Eu poderia ficar chorando na cama de lençóis mal lavados da pensão que cheira a mofo. Não é triste e sim especialmente corajoso e forte para mim. Para mim que sei a sensibilidade de pluma que carrego. Eu compartilho sem óculos escuros. Eu dou sem pedir nada em troca. Nada me dão.

Eu agora tomo um café num bar paquistanês que não é de esquina. Está escondido entre um bazar e uma loja de doces. O bar não é doce. Todas as mesas só têm duas cadeiras e geralmente só uma está ocupada. Estão sozinhos como eu. Era o lugar dos viajantes solitários, dos corações “desplazados” que se acolhem na simpatia universal dos paquistaneses. O café estava especialmente bom visto tudo que estava acontecendo. A mão que segurava a xícara recém saída do lava-louças era a única parte do meu corpo que estava aquecida.

Hora de caminhar novamente. Sentir os olhos ardendo e não colocar os óculos de sol. Perante todos os desastres a vida é mais importante. Mesmo ela sendo sem importância os sem emoção. Mesmo que ela seja cheia de emoção e não se tenha com quem compartilhar. Mesmo que ela tenha emoção, tenha-se com quem compartilhar mas isso não seja suficiente pra vc ser feliz. Minha existência é ínfima mas é minha e por isso ela é a mais bela e mais importe que todas as outras. As outras? Existências miseráveis. Já dei prova que uso as existências alheia e nunca me arrependi.

Consegui chegar ao meu destino sem mais lágrimas. Me acompanhava a linha do trem. Incrivelmente a dura jornada de ir sem vontade foi acompanhada da lembrança de que eu vou voltar. Quando tudo acabar pego o meu trem R-598 e volto para a primeira das minhas bonecas russas. Vou caminhando ao lado da linha do trem e depois vou voltar para a primeira das minhas bonecas russas.


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Alba tem medo. Nervosa se encosta em uma grande pilastra branca do templo e olha pra cima. Ontem ela puxou papo comigo e eu fui aquela simpática tolerante que não dá muita atenção.Tem espaço para mais quatro pessoas do meu lado e ela não se senta. Fica em pé a dois metros de distancia me observando.

Olho para a vidraça na minha frente e aproveito para me observar também. Sim. Alba estava tentando entender porque alguém no meu estado havia saído de casa. Acho que ela percebeu que eu estava me olhando e ficou ainda mais na expectativa e na curiosidade. Nesse momento dois protótipos de pessoas amebas sentaram ao meu lado. Nem vou comentar os assuntos que de tão inúteis chegam a obscenos. Lá se vai o lindo silencio entre eu e Alba. Vai-se o silencio, fica o abismo.

jpg.//stephanie towell

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